quinta-feira, 4 de março de 2010

Meu coração tardou

Meu coração tardou







Meu coração tardou. Meu coração


Talvez se houvesse amor nunca tardasse;


Mas, visto que, se o houve, houve em vão,


Tanto faz que o amor houvesse ou não.


Tardou. Antes, de inútil, acabasse.






Meu coração postiço e contrafeito


Finge-se meu. Se o amor o houvesse tido,


Talvez, num rasgo natural de eleito,


Seu próprio ser do nada houvesse feito,


E a sua própria essência conseguido.






Mas não. Nunca nem eu nem coração


Fomos mais que um vestígio de passagem


Entre um anseio vão e um sonho vão.


Parceiros em prestidigitação,


Caímos ambos pelo alçapão.


Foi esta a nossa vida e a nossa viagem.






Fernando Pessoa

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